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Medo do desemprego é maior entre negros

Racismo estrutural dificulta ascensão de negros no mercado de trabalho

No segundo trimestre de 2020, o índice de desemprego geral atingiu 13,3%, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua do IBGE. Quando estratificado esse dado com base na cor da pele, a taxa de desemprego de pretos ficou em 17,8%, de pardos, 15,4%, e de brancos, 10,4%. “Os setores onde está tendo a maior redução de postos de trabalho e como consequência o aumento de desemprego, são setores onde majoritariamente empregam pessoas negras - a construção civil e o comércio, que também apresentam característica de salários mais baixos em relação aos outros setores”, explica o professor de economia da Una, Cleyton Izidoro.

No dia 20 de novembro se celebra o Dia da Consciência Negra, com o crescimento do debate sobre racismo estrutural e institucional e o seu reflexo no mercado de trabalho. Para a professora de Direito da Una Núbia Elizabette de Jesus Paula, negros não podem se contentar com os papeis que estão arraigados no imaginário social, ocupando somente funções de baixa remuneração e que exigem pouca escolaridade. “O racismo estrutural está enraizado na sociedade brasileira. Eu, mulher negra, não vejo problema em ser profissional de serviços gerais, babá, empregada doméstica ou gari. São profissões dignas e de extrema importância. O problema é quando um grupo de pessoas brancas entendem que essas profissões são destinadas a negros, e não existe outra alternativa”, diz.

Núbia incentiva a luta para exigir políticas de igualdade e acesso no Brasil e defende que não basta não ser racista, é preciso ser antirracista. “Ficar em cima do muro já não adianta. Não é preciso ser negro para compreender a violência que o racismo representa. Neste sentido, mais que a utilização da igualdade tal como proposto na Constituição Federal, precisamos da utilização da equidade, da abertura de oportunidades, tornando-as mais justas para todos”, diz.

A ascensão do negro no mercado de trabalho está intimamente ligada à educação. Programas de diversidade, políticas públicas, e a democratização do ensino superior precisam ser vistas como parte da governança das empresas e estarem nas metas governamentais.

A psicóloga e empreendedora Betânia Pêgo, 27 anos, se formou na Una, com bolsa de 100% do Prouni. “Os meus grandes desafios durante a graduação foram de ordem econômica, adaptativos e de saúde mental. O fato de não pagar faculdade todo mês, não eliminava a angústia de não ter dinheiro necessário para arcar com todas as outras despesas essenciais como alimentação e transporte”, conta.

Betânia é a primeira pessoa da família a conquistar um diploma de ensino superior. “De repente me tornei a filha psicóloga, a tia psicóloga, a irmã psicóloga, os meus pais falam disso com orgulho, mostram fotos, guardam cartões, se alegram, sempre que estamos juntos recordamos dos tempos difíceis, de onde moramos e o que passamos”.

O desejo dela é que pessoas pretas tenham recursos e liberdade para sonhar e realizar. “Eu não quero ser só a história trabalhada no mês da consciência negra, embora saiba que seja importante. Eu me considero uma boa psicóloga, mas ser a melhor, ser excelente, ser duas vezes melhor, sempre está na minha cabeça pelo fato de ser uma pessoa preta, são coisas que me proponho e que sigo às voltas com minha analista”, diz.

Se a escolha da carreira profissional é difícil para os jovens, é mais para os negros. Muitas vezes o caminho tomado foi definido para tentar driblar o medo do desemprego. Antes de entrar para o curso de Gastronomia da Una, Júlio César Cândido de Souza, 22 anos, tentou Nutrição. Já no terceiro período enfrentou ansiedade e depressão. Trancou a faculdade e voltou para a casa dos pais em Betim para realizar o sonho da gastronomia. “Quando saí do Ensino Médio, já gostava da cozinha, mas eu escutava que essa era uma área para gente rica. E eu como homem, já tinha que ter uma profissão direito”, diz.

Hoje, Júlio César conta com o apoio da família e investe na criação e produção de doces. O empreendimento, por enquanto, é divulgado no Instagram. Segundo ele, falta representatividade no setor. “É uma área seletiva, que não atrai negros. Não tenho professores negros, assim como não vejo chefes famosos na TV da minha cor”, diz.

Júlio se inspira em João Diamante, chef e empreendedor social que tem se destacado no cenário gastronômico do Rio de Janeiro. “Ele é premiado, mas não se distanciou da culinária raiz e não se afasta das suas origens”, diz.

Essa é a meta de Júlio, crescer na gastronomia e aumentar a representatividade no segmento. “Quero que as pessoas se identifiquem comigo porque a gastronomia é para todo mundo. Quero que mais negros venham para a gastronomia. No Instagram tenho postado receitas fáceis de serem executadas. Os pobres e pretos ainda têm muito receio. Espero ser referência para essas pessoas e reconhecido pelos meus pares”, diz.

Foto: Divulgação

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